top of page

REPORTAGEM ELABORADA EM OUTUBRO E NOVEMBRO DE 2014, PARA SER INCLUÍDA NO PRIMEIRO NÚMERO DE UMA NOVA REVISTA DE ÂMBITO NACIONAL A LANÇAR EM DEZEMBRO DE 2014 OU JANEIRO DE 2015, MAS CUJO LANÇAMENTO ACABOU POR SER ADIADO SINE DIE...

Algarve em duas rodas:

o BTT veio para ficar!

CARLA TEIXEIRA

São cada vez mais e estão por toda a parte. Homens e mulheres, equipados mais ou menos a rigor, com máquinas mais ou menos apetrechadas, aproveitando os fins-de-semana ou aquela horinha depois do trabalho, sozinhos ou em grupo, os algarvios estão rendidos ao charme da bicicleta. A prática de BTT tem crescido de forma exponencial nos últimos anos, e se para alguns a coisa não passa de uma moda, para outros é garantidamente um amor para a vida. Nada estranho numa região com mais de 300 dias de sol por ano e que detém a maior rota ciclável do país, com 214 quilómetros.

 

CARLA TEIXEIRA

 

Famoso pelas praias de areia branca e águas tépidas, pelos invernos curtos e amenos e verões longos e quentes, pela rica gastronomia e pelo vasto património natural e construído, o Algarve é hoje a terceira região mais rica de Portugal, depois do Vale do Tejo e da Madeira, com um PIB per capita de 86% da média da União Europeia (Eurostat 2011). É também o mais importante destino turístico nacional e um dos mais relevantes a nível europeu. Palco perfeito para a prática de desportos de ar livre, tem na bicicleta a sua maior embaixadora: com um histórico de vitórias na Volta a Portugal (1947, 1948, 1988, 2008, 2009 e 2010) e presença assegurada dos melhores atletas do mundo na Volta ao Algarve, no BTT a região destaca-se pelos imensos praticantes, mais ou menos conhecidos do grande público, e pelo facto de aqui, no Clube BTT Terra de Loulé, estar sediada a maior escola de ciclismo do país.

Miguel Raimundo, conhecido no meio desportivo como Mike, e Rui Silvestre, que na sua Algarve Nature Adventure dinamizam diversas actividades ao ar livre em terra, mar e ar, consideram que “o BTT está na moda” e por isso “tem conquistado muitos adeptos no Algarve”, que reúne condições de excelência para a prática da modalidade: “O clima é muito agradável durante grande parte do ano, temos a maior ciclovia do país, colectividades muito activas na organização de provas e o apoio de várias entidades”, públicas e privadas. “Vemos com bons olhos este aumento do interesse pelo BTT, que concilia a prática de exercício físico com o usufruto da Natureza e das características únicas da região”, explicam.

À margem da Mike & Friends Ultra BTT 2014, prova organizada pela Algarve Nature Adventure que em Outubro ligou Vila Nova de Mil Fontes a Faro, num percurso de cerca de 160 quilómetros, Miguel e Rui confidenciaram que “o apoio da Câmara Municipal de Faro tem sido inexcedível”, materializando-se, naquela prova, na cedência de um autocarro para transportar os participantes até Milfontes, de onde depois pedalaram até Faro, e dos balneários da Escola Afonso III para os banhos no final da prova. Apontando a crise como “a desculpa mais fácil para as empresas recusarem dar apoio” a este tipo de iniciativas, Mike diz que na verdade “há muitos eventos a decorrer praticamente ao mesmo tempo, e por vezes há empresas que ficam desagradadas com o amadorismo na organização de algumas provas, e que depois se retraem na hora de apoiar estes eventos”.

Bruno Rosa, atleta da equipa BTT Loulé que habitualmente vemos em provas do campeonato nacional, da Taça de Portugal ou do Open de Espanha, e que há meses se sagrou Campeão Nacional Universitário de BTT Cross Contry, foi o primeiro a cortar a meta na Mike & Friends 2014, ao fazer os 160 quilómetros em 6h25m. “Não tinha noção da concorrência, porque não tinha visto a lista de inscritos antes da prova, mas estava optimista e confiante. Esperava ficar no top 5, mas felizmente acabei por vencer”, disse o atleta no final da maratona, acrescentando que “nestas provas de maior distância é preciso fazer uma boa gestão da parte física e da parte psicológica, e ter algumas noções de leitura de GPS, esperando que ele não falhe. Hoje tive alguns problemas com isso, mas acabei por conseguir ultrapassá-los e terminar a prova em primeiro lugar, o que me deixa bastante feliz”.

 

PEDALAR NO FEMININO

 

“A Ultra acaba de ficar mais bonita! Há uma senhora inscrita”. Foi assim que a Algarve Nature Adventure apresentou, no evento criado no Facebook para reunir os participantes da Ultra BTT, a única atleta do sexo feminino a registar-se na prova. Ana Sofia Cruz, técnica de contabilidade de Faro, ousou, aos 44 anos, ser a única mulher entre mais de 60 homens, e percorreu, taco a taco com eles, os 160 quilómetros da prova. E não, não foi a última classificada!

Demorou mais de 10 horas a cumprir o percurso, mas a satisfação de participar foi enorme, pois embora pratique desporto desde sempre (atletismo na adolescência e actualmente ginástica localizada, spinning e canoagem), desde que descobriu o BTT não imagina a sua vida sem pedalar. Desafiada por uma amiga a participar num passeio de bicicleta de 25 quilómetros em Alte, no Concelho de Loulé, há cinco anos, nem pensou duas vezes: “Não andava de bicicleta desde criança, e nem tinha uma, mas a minha amiga emprestou-me a antiga dela e fui. A partir daí nunca mais parei, e pouco tempo depois estava a comprar a minha primeira bicicleta”, recorda. Em média pedala duas vezes por semana, e fá-lo essencialmente por lazer, embora reconheça “o bichinho da competição” a faz tentar ir sempre um pouco mais longe.

CARLA TEIXEIRA

Ana faz parte de uma equipa informal de BTT, a Gurus Bike Team, “um grupo de amigos de ginásio que descobriram no gosto por pedalar um interesse comum”. É normalmente com esse grupo que pedala, considerando que é sempre mais agradável praticar em grupo do que sozinha. Atraída pela “sensação de liberdade” que o BTT proporciona, e pela certeza de poder ir a qualquer lado de bicicleta, limitada apenas pela sua capacidade física e pelas características da máquina, diz-se também “fascinada” pela forma como a modalidade permite “o contacto com a Natureza, a possibilidade de conhecer lugares lindíssimos, muitas vezes inacessíveis por outros meios, e o convívio saudável que surge naturalmente entre os praticantes. Até hoje não houve desporto que me apaixonasse mais”, assegura.

Mulher num desporto ainda muito tomado pelos homens, garante não sentir discriminação: “Os que me conhecem sabem que partilhamos os mesmos interesses e que não gosto de ser tratada de modo diferente por ser mulher. Sempre fui muito bem recebida e aprendi imenso com os amigos que praticam BTT comigo”. Sobre o facto de haver ainda poucas mulheres na modalidade, responde assim: “Suponho que a ausência das mulheres se deva a diversos factores, um dos quais, talvez o mais determinante, a falta de disponibilidade, em geral, das mulheres, que na nossa sociedade têm um papel mais activo a nível familiar, o que lhes toma muito tempo”. Tendo dois filhos já adultos, admite que teria sido muito complicado quando eles eram menores dedicar o tempo que hoje dedica ao BTT, e por isso compreende que haja poucas mulheres a dispor desse tempo.

Desafiada a deixar uma mensagem aos praticantes em geral e às mulheres em particular, Ana Sofia diz aos que já praticam para continuarem a pedalar e aos que ainda não experimentaram que o façam, pois “a sua vida mudará para melhor! O BTT é um desporto que se adequa a todas as fases da nossa vida. Acho que as mulheres devem procurar encontrar tempo para o praticar e não devem deixar-se intimidar por ainda sermos poucas. Venham e tragam amigas! Assim seremos mais”. Em jeito de conclusão, atesta que conheceu mais gente desde que pratica BTT do que no resto da sua vida. “Quanto mais pedalo, mais vontade tenho de pedalar e de aceitar novos desafios, e de testar os meus limites. A prática do BTT tornou-me uma pessoa melhor, mais feliz e mais segura, pessoal e profissionalmente. Hoje não tenho medo arriscar e estou sempre pronta para descobrir novos trilhos, mesmo que sejam sinuosos”…

ANABELA CONCEIÇÃO

CARLA TEIXEIRA

JOÃO MARQUES

Trocar o comboio pela bicicleta

 

Foi entre comboios e estações que, há quase dois anos, vários profissionais do Centro de Manutenção da REFER (Rede Ferroviária Nacional) em Tunes descobriram um interesse e uma paixão em comum: a bicicleta. Alguns eram já praticantes assíduos, outros estrearam-se nessa altura, com a organização de passeios e convívios. Nem sempre conseguem reunir o grupo completo, mas há um pequeno núcleo que pelo menos uma vez por semana, depois do trabalho, troca o comboio pelas duas rodas e parte à descoberta de novos trilhos… 

 

CARLA TEIXEIRA

DIREITOS RESERVADOS

Aproximadamente 40 anos após o seu surgimento, na década de 1970, nas montanhas da Califórnia, nos Estados Unidos, o BTT continua a reunir adeptos em todo o mundo. No Algarve tem sido especialmente evidente, nos últimos anos, o crescimento da modalidade. São imensas as associações que promovem o uso da bicicleta, e que dinamizam a realização de provas e passeios para reunir os apaixonados, e é raro o dia, principalmente aos fins-de-semana, em que não os vemos, às dezenas, circular nas estradas e nos trilhos mais ou menos difíceis da região. Foi em busca dessa adrenalina, e da fuga ao stress que o BTT permite, que nasceu, há cerca de dois anos, no seio do Centro de Manutenção da REFER, em Tunes, um grupo de colegas de trabalho apostado em vencer obstáculos em cima das duas rodas. E se nem sempre é fácil reunir toda a gente, já que são muitas as condicionantes da vida e dos horários de cada um, há quem aposte a sério na assiduidade. Alexandre Vieira, de 32 anos, Luís Silva, de 36, Paulo Oliveira, de 44 anos, e Rui Justo, de 37, estão no grupo dos mais perseverantes e tentam nunca faltar à chamada. Uma vez por semana, normalmente às terças-feiras, partem para a sua “voltinha”, seguindo um percurso previamente definido, no âmbito de um grupo que já ultrapassou as fronteiras da REFER e acolhe agora elementos externos à empresa.

 

Apesar de ser o mais jovem dos quatro, Alexandre é o praticante com mais experiência e assiduidade: há 14 anos, uma queda aparatosa levou-o a abandonar o motocross, que até aí praticava, e foi depois disso que comprou a sua primeira bicicleta. Foi na zona de Coimbra, de onde é natural e onde vivia na altura, que se estreou nos passeios em duas rodas, e o BTT fascinou-o de tal forma que nunca mais parou: a primeira bicicleta, de um modelo mais simples e económico, foi rapidamente substituída por uma superior, e depois desse houve vários outros upgrades para ir melhorando o equipamento e a performance. Garante que não fica caro praticar BTT se houver alguns cuidados essenciais com a máquina, que deverá ser bem lavada, lubrificada e revista após cada saída. “O que custa mais é o investimento inicial, na compra da bicicleta. Depois o que se gasta é pouco significativo: em média não devo gastar mais do que 10 ou 15 euros por mês em barras de cereais, geles e bebidas isotónicas”. Já no que toca a manutenções extraordinárias, a despesa é menos previsível, porque depende do material que vai avariando ou sofrendo desgaste e que é preciso substituir.

FOTO DO FACEBOOK

Casado e com uma filha bebé, Alexandre reconhece que não tem hoje o tempo que gostaria de dedicar a este desporto, mas ainda assim tenta praticar uma ou duas vezes por semana. Gosta mais de pedalar com amigos, mas também o faz sozinho, quando isso não é possível. O que mais importa, diz, é sermos capazes de “libertar um pouco a pressão que temos diariamente em nós, devido a questões pessoais ou familiares, de trabalho ou outras. Devia haver maiores incentivos ao uso da bicicleta como meio de lazer e transporte”, diz, lamentando que, no BTT ou no ciclismo de estrada, os ciclistas não sejam respeitados como utilizadores de direito da via pública que são.

SANDRA CONCEIÇÃO

 

Luís Silva sempre teve bicicletas, mas começou a pedalar “mais a sério” há três anos, altura em que vivia e trabalhava em Torres Vedras, berço de Joaquim Agostinho (ícone do ciclismo português que viria a morrer na sequência de uma queda na X Volta ao Algarve, em 1984) e terra de grandes tradições no desporto em duas rodas. Por influência de amigos, e porque queria iniciar algum tipo de actividade física, começou a pedalar regularmente. Fazia-o quase sempre em grupo, mas ocasionalmente também sozinho, tendo chegado a deslocar-se de casa para o local de trabalho (a Estação de Caminhos-de-Ferro do Ramalhal, a sete quilómetros da cidade) montado numa bicicleta que entretanto lhe foi furtada. O revés não o fez desistir do BTT.

A viver em Faro desde 2012, Luís participa religiosamente nas voltas das terças-feiras (que inicialmente tinham lugar às quartas, mas cujo calendário foi alterado para não interferir nas aulas da Licenciatura em Engenharia Eléctrica e Electrónica que frequenta em horário pós-laboral na Universidade do Algarve), e sempre que é possível vai pedalar nas manhãs de sábado ou de domingo, sozinho ou na companhia de Alexandre.

O que Luís mais aprecia no BTT é a comunhão com a Natureza, e pedalar duas vezes por semana “sabe a pouco: se tivesse oportunidade, pedalaria mais vezes”, assevera. Depois de algum treino, diz, “o cansaço que sentimos no fim de cada jornada torna-se saboroso, porque representa mais alguns quilómetros percorridos e novos desafios superados”.

Consciente de que a prática regular de exercício físico nos ajuda a manter a mente sã num corpo são, sobre as vantagens de pedalar com colegas de trabalho, Luís é peremptório: “Acaba por ajudar a criar laços de amizade no emprego, o que torna mais agradável e descontraído o nosso quotidiano”, questão particularmente importante quando, como acontece amiúde na REFER, os funcionários são muitas vezes deslocados das suas cidades para outras, onde têm de viver e trabalhar. Natural de Vila Nova de Anços, no Concelho de Coimbra, Luís reconhece que o Algarve tem características únicas para a prática do BTT: “Pelo clima e pela geografia, a região é bastante interessante para a prática deste desporto, que está na moda e tem conquistado muitos praticantes nos últimos anos”. Só falta, diz, que as cidades se adaptem melhor a este fenómeno: “O BTT, e o ciclismo em geral, é essencialmente um desporto, mas poderia ser visto também como um meio de transporte ecológico. Se as cidades se adaptassem a essa realidade teríamos menos tráfego automóvel e menos poluição, o que seria bom para todos”.

 

Paulo Oliveira estreou-se no BTT há cerca de ano e meio. “No início fui apenas pelo convívio, mas depois isto tornou-se um hobby e uma forma de fazer alguma actividade física. Por viver longe da maioria dos colegas nem sempre tenho disponibilidade para as voltas em grupo, por isso às vezes vou pedalar sozinho. Normalmente saio de bicicleta uma vez por semana, mas se tivesse mais tempo aumentaria de certeza o número de saídas”, refere.

Vincando que pedala essencialmente por prazer, recusa para já a participação em provas de competição, e foca-se nas “grandes vantagens deste desporto: o convívio, a realização de actividade física, a hipótese de conhecer locais que de outra forma não seria expectável que conhecesse”. Tal como Alexandre e Luís, Paulo considera que “participar neste tipo de actividades com colegas de trabalho melhora as relações laborais e torna o dia-a-dia mais agradável”.

Admitindo que, “se levada a sério, a prática de BTT pode ficar muito cara”, Paulo garante não ter muitos gastos, já que pedala apenas por prazer, sem grandes preocupações com a performance: “Comprei uma primeira bicicleta, que custou 400 euros, e mais tarde outra, um pouco melhor e mais cara. Além disso tenho de considerar a compra de consumíveis ou produtos de limpeza, e às vezes compro calções ou luvas. A busca do equipamento perfeito nunca acaba, mas temos de ter em conta o orçamento de que dispomos”, avisa.

FOTO DO FACEBOOK

SANDRA CONCEIÇÃO

 

Rui Justo (ao centro na foto) estreou-se no BTT há cerca de 15 anos, mas registou um interregno de “sete ou oito” na sua prática. Casado, o engenheiro civil admite que nem sempre tem a disponibilidade que desejaria ter para a prática desportiva. Actualmente pedala em norma uma vez por semana, embora gostasse de o fazer pelo menos duas. Gosta especialmente de pedalar com amigos, usufruindo “ao máximo do ar livre e da paisagem” escolhida em cada saída. Procura o prazer quando pedala, mas reconhece que com a prática mais regular deste exercício o desempenho tende a ser mais eficaz e os limites físicos de cada praticante vão sendo naturalmente ultrapassados: “O BTT reforça a capacidade física, as relações interpessoais e a camaradagem, e potencia uma maior qualidade de vida e até uma melhor condição de saúde”.

No que respeita aos custos desta paixão, Rui considera que “podem ser reduzidos ou extremamente altos, em função da regularidade e do tipo de treinos ou competições em que se participa”. Pedalar no final de um dia de trabalho, na companhia de alguns colegas, “é uma excelente forma de aliviar algum stress”, assevera, acrescentando que compreende a prática de qualquer desporto como “um exercício de liberdade e de permanente superação dos próprios limites”.

Algarve na mega-ciclovia

que cruza toda a Europa

A Ecovia do Litoral Algarvio é a maior rota ciclável existente em solo português. Liga Sagres a Vila Real de Santo António, atravessando os 12 concelhos do litoral meridional do Algarve, e mergulha nas paisagens de rara beleza da Ria Formosa e da Ria de Alvor. São 214 quilómetros que servem também de ponto de partida para a primeira rota da Eurovelo, a mega-ciclovia europeia que em 2020 ligará 43 países, cruzando o continente em 14 rotas, num total de mais de 70 mil quilómetros…

 

CARLA TEIXEIRA

 

A Comissão Europeia publicou, em Dezembro de 2013, o seu barómetro relativo à atitude dos europeus face à mobilidade urbana. À luz daquele documento, 49% dos cidadãos do Velho Continente fazem uso regular da bicicleta como meio de transporte no seu quotidiano. Uma média relativamente elevada que esconde as enormes discrepâncias verificadas numa análise da informação em cada um dos países: na Holanda, líder deste ranking, 43% dos cidadãos usam a bicicleta pelo menos uma vez por dia, 28% várias vezes por semana, 16% apenas algumas vezes por mês e só 13% referem não ter o hábito de pedalar. No outro extremo do gráfico, em Malta, só 1% dos cidadãos utiliza a bicicleta diariamente, 2% várias vezes por semana, 4% algumas vezes por mês e uns estrondosos 93% não têm ou nunca pegam na bicicleta. Algures pelo meio, embora a pender para o lado mais negro da tabela, surge Portugal, onde 7% dos cidadãos dizem utilizar a bicicleta todos os dias, 8% várias vezes por semana, 10% algumas vezes por mês e 75% nunca.

Sem números oficiais relativos às regiões de cada país, resta-nos a convicção de que o Algarve subverte um pouco o cenário traçado para Portugal, já que, pelas suas características únicas de clima e geografia, é raro o dia em que não vemos dezenas de pessoas montadas nas suas bicicletas, ao longo das estradas e ciclovias ou em trilhos mais ou menos acidentados e desafiadores. Para isso contribuirá certamente a existência de numerosos percursos cicláveis, com especial destaque para a chamada Ecovia do Litoral, a maior rota ciclável existente em Portugal. De Sagres a Vila Real de Santo António, estende-se ao longo de 214 quilómetros recheados de paisagens de tirar o fôlego ao mais capaz dos ciclistas e coincide, em toda a sua extensão, com a parte inicial do traçado da primeira rota da Eurovelo, a extensíssima rede de ciclovias actualmente em construção ao longo de todo o continente europeu e que em 2020 deverá ligar 43 países, num total de mais de 70 mil quilómetros.

Baptizada como Rota da Costa Atlântica, a Eurovelo 1 decalca precisamente todo o trajecto da Ecovia do Litoral e no final desta, em Vila Real de Santo António, atravessa a fronteira e prossegue por Espanha, França, Irlanda e Reino Unido, terminando na Noruega, mais de oito mil quilómetros depois. A rota que arranca em Portugal é a segunda mais extensa das 14 previstas, no âmbito de um ambicioso e muito interessante projecto que preconiza o fomento do uso da bicicleta, quer em passeios turísticos quer nas deslocações diárias das populações servidas por estas rotas. A conclusão desta enorme ciclovia deverá permitir, em teoria, que a partir de 2020 seja possível percorrer toda a Europa em duas rodas, de acordo com o ritmo e a disposição de cada ciclista, sendo que cada rota permitirá a fruição das paisagens, do património e dos costumes dos países em que se integra. No caso português, ao cruzar a paisagem singular do litoral algarvio a Eurovelo 1 brindará os visitantes com dunas, baías, enseadas e vastos areais espraiados ao longo da Ria Formosa e da Ria de Alvor.

 

REDE EM CRESCIMENTO

 

Surgido numa reunião da Federação Europeia de Ciclistas com as suas associadas Sustrans e Frie Fugle, o projecto Eurovelo foi formalmente apresentado em 1997 na cidade de Logroño, em Espanha, prevendo a criação de 12 rotas cicláveis de longo curso. Dez anos mais tarde, a federação assumiu a coordenação do projecto, que hoje contempla 14 percursos, numerados segundo a orientação que seguem: as rotas ímpares estendem-se de Norte para Sul, as rotas pares no sentido Este/Oeste (não existe o número 14, já que há oito percursos “verticais” mas apenas seis “horizontais”): 1 – Rota da Costa Atlântica: Cabo Norte/Sagres (8.168 km); 2 – Rota das Capitais: Galway/Moscovo (5.500 km); 3 – Rota dos Peregrinos: Trondheim/Santiago de Compostela (5.122 km); 4 – Rota da Europa Central: Roscoff/Kiev (4.000 km); 5 – Via Romea Francigena: Londres/Roma/Birindisi (3.900 km); 6 – Rota do Atlântico ao Mar Negro: Nantes/Constança (4.448km); 7 – Rota do Sol: Cabo Norte/Malta (7.409 km); 8 – Rota do Mediterrâneo: Cádis/Atenas e Chipre (5.888 km); 9 – Rota do Báltico ao Adriático: Gdansk/Pula (1.930 km); 10 – Circuito do Mar Báltico (7.980 km); 11 – Rota da Europa de Leste: Cabo Norte/Atenas (5.984 km); 12 – Circuito do Mar do Norte (5.932 km); 13 – Rota da Cortina de Ferro: Mar de Barents/Mar Negro (10.400 km); 15 – Rota do Reno: Andermatt/Hoek van Holland (1.320 km).

O BTT visto através

da câmara fotográfica

 

Terra de aficionados pelo BTT, o Algarve conta sempre muitos espectadores nas muitas provas que se vão realizando na região. Há quem se limite a assistir às competições, mas há também quem registe para a posteridade os momentos mais marcantes. A maioria fotografa familiares e os amigos, mas outros, como Sandra Conceição, fotografam tudo e todos. É a paixão pela bicicleta vista de outro ângulo…

 

CARLA TEIXEIRA

FOTO DO FACEBOOK

Sandra Conceição é uma das presenças mais assíduas nas inúmeras provas de BTT que se vão realizando por todo o Algarve. Não monta uma bicicleta, mas está quase sempre lá, de câmara fotográfica na mão, a registar os momentos mais marcantes de cada competição. Em 2009 foi desafiada por uma amiga para integrar a Secção de BTT «Os leões de Olhão», mas cedo percebeu que “não era grande ciclista” e optou por acompanhar os amigos como fotógrafa. Hoje, aos 39 anos, a recepcionista diz que venceu a timidez dos primeiros tempos e está à vontade atrás da câmara: “De início tinha receio de que as pessoas não gostassem de ser fotografadas por uma desconhecida, mas hoje vejo que não havia motivo para esse receio, porque sempre fui bem recebida. Os atletas ficam contentes por ter registos do seu esforço e as organizações ficam com meios para documentar as suas provas e para as divulgarem”, revela.

Não faz qualquer uso comercial das imagens. Partilha-as nas redes sociais e até as envia aos atletas que o solicitem. Quando lhe perguntam por que razão não tenta ganhar dinheiro com este hobby, diz que “isso implicaria uma logística mais complexa”. Apesar disso, reconhece que acompanhar estas provas dá bastante trabalho, pois é preciso preparar tudo com antecedência: “Temos de analisar bem o percurso, perceber qual a abordagem a fazer e posicionar-nos de modo a obter o melhor ângulo sem atrapalhar a prova. Acima de tudo não podemos ter receio de nos sujarmos. Quando vou acompanhar uma prova sei que vou apanhar lama, chuva e frio, e que apesar de me deslocar de carro, posso ter de fazer vários quilómetros a pé até encontrar um trilho visualmente agradável. Sei que terei de me sentar nos muros para deixar espaço para os atletas passarem, abstrair-me dos ruídos rastejantes ao redor…”.

Sobre a escassa participação das mulheres no BTT, Sandra é clara: “Não considero que seja por falta de capacidade ou coragem que há menos mulheres do que homens nas provas com percursos mais longos! Há atletas femininas com melhores resultados do que os participantes masculinos. Podem não estar mentalizadas de que são capazes de fazer mais, ou gostar de apreciar os percursos sem o sofrimento que uma maratona ou uma ultra-maratona implicam. Depois há a menor disponibilidade das mulheres, com os afazeres domésticos e os filhos, especialmente se forem pequenos, mas acho que é uma questão de tempo até que haja mais mulheres a apostar neste desporto”, vaticina.

 

bottom of page