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REPORTAGEM PUBLICADA NO JORNAL «O PRIMEIRO DE JANEIRO» EM JULHO DE 2008

 

EXAGERADA EXPOSIÇÃO AO SOL PODE PROVOCAR INTOLERÂNCIA, ALERGIAS E CANCRO CUTÂNEO​

Tempo quente que apoquenta!

 

Toda a gente se interessa pelo tempo, e o boletim meteorológico é seguido, muitas vezes, com a atenção dada aos noticiários. Mas se muitos se dão bem com o calor, e anseiam por ele, outros sentem-se incomodados pelas altas temperaturas. O sol é fonte de prazer e de risco...

CARLA TEIXEIRA

A Organização Metereológica Mundial considera que toda a gente se interessa pelo estado do tempo, e afirma mesmo que, “em muitos países, o boletim meteorológico é um dos programas televisivos mais populares”, já que “as pessoas necessitam de saber com o que podem contar no dia seguinte, podendo assim preparar-se melhor para as suas tarefas”, que incluem por vezes actividades ao ar livre, estruturar uma possível viagem para um país diferente, ou simplesmente acautelar a ocorrência de fenómenos naturais, como tempestades, ciclones ou maremotos. Portugal tem, nos últimos anos, enfrentado sucessivos verões quentes, mas inconstantes, em que as temperaturas são elevadas, mas repentinamente interrompidas por dias frescos ou mesmo episódios de precipitação.

Do casaco às sandálias, do guarda-chuva ao panamá, os portugueses começam a habituar-se às variações do estado do tempo e, mais do que isso, a ansiar pelo que antes chegava mais cedo, de forma intensa: o calor. É se, há relativamente poucos anos, Abril e Maio eram muitas vezes sinónimo de temperaturas altas em Portugal, que já “pediam” praia, actualmente muitos cidadãos desabafam a sua tristeza por o Verão chegar muito tardiamente. No outro extremo, porém, estão os que se sentem incomodados com o calor, conceito subjectivo que, de acordo com os especialistas, “varia de uma pessoa para pessoa e depende de vários factores”, como a idade, o tipo de alimentação, o ciclo menstrual, a menopausa, as eventuais doenças de que se sofre ou a capacidade de adaptação às temperaturas mais altas.

Porque “as glândulas sudoríparas são controladas pelo sistema nervoso”, sendo a transpiração a principal reação fisiológica ao aumento do calor, apesar de menos efectiva em ambientes húmidos, quando o calor aperta chegam os primeiros sinais de desconforto, ou mesmo de perigo. Se uma alergia ao sol, cada vez mais comum nas sociedades modernas, não parece constituir problema de maior, a intolerância ao calor pode revestir contornos mais dramáticos quando chega à desidratação, às vezes fatal, à sudorese excessiva ou à perda dos sentidos, associada a tonturas e a um mal-estar generalizado. Mais grave, contudo, é o risco de cancro da pele, que a excessiva exposição ao sol pode potenciar, e cujo combate está sempre na mira dos especialistas. Nessa linha, ano após ano, a chegada do Verão coincide com a divulgação de uma série de conselhos, designadamente para os veraneantes, mas extensiva aos grupos de maior risco e à população em geral.

Médicos, bombeiros, Direcção-Geral de Saúde, Protecção Civil e Instituto Nacional de Emergência Médica desdobram-se, aos primeiros raios de sol mais intenso, em esforços para divulgar as suas campanhas informativas, que explanam os cuidados a ter com o calor. Porque “a exposição a períodos de calor intenso constitui uma agressão ao organismo, que pode levar a desidratação, agravamento de doenças crónicas, esgotamento ou golpe de calor, situação muito grave e que pode provocar danos irreversíveis”, o INEM avisa que “são especialmente vulneráveis ao calor as crianças com menos de três anos, as pessoas idosas, os portadores de doenças crónicas (cardiovasculares, respiratórias, renais, diabetes, alcoolismo), as pessoas obesas, os acamados, os trabalhadores ao ar livre e as pessoas que estão a fazer medicação com anti-hipertensores, anti-arrítmicos, anti-depressivos, neurolépticos e diuréticos, entre outros”.

Num apelo subscrito pelos serviços de Protecção Civil, que emitiram uma nota com os mesmos conselhos, o INEM frisa a importância do aumento da ingestão de água e de sumos naturais, sem açúcar. Deve evitar-se o recurso às bebidas gaseificadas e alcoólicas (que por causa do calor são absorvidas mais rapidamente), à cafeína e às bebidas açucaradas, que provocam ou apressam a desidratação. Pessoas que sofram de doença crónica, ou que estejam a fazer uma dieta com pouco sal ou com restrição de líquidos, deverão aconselhar-se com o seu médico assistente ou pela Linha Saúde 24, através do número 808242424. Nas horas de maior calor (11-16), deve evitar-se a exposição solar (se não puder ser evitada, usar sempre protector solar), e qualquer emergência deverá ser comunicada ao INEM, pelo 112.

A estes conselhos, a Protecção Civil acrescenta ainda o de usar roupas leves e de algodão, preferencialmente de cores claras, abrir as janelas de casa durante a noite (para fazer o ar circular e arrefecer) e correr as persianas durante o dia. No duche deve utilizar-se água tépida, já que a água muito fria provocaria um choque térmico com o corpo muito quente. Na rua deve cobrir-se o corpo e a cabeça, usar óculos escuros e com protecção ultravioleta, optando sempre, se possível, pelas viagens de automóvel nas horas de menor calor. Todos estes cuidados devem redobrar-se quando digam respeito a bebés, crianças e idosos, que devem ser constantemente vigiados por adultos.

ALIMENTAÇÃO

PRATOS MAIS LEVES

No que respeita às refeições, o Instituto Nacional de Emergência Médica aconselha a escolha de pratos mais leves e de refeições mais frequentes, sendo de evitar as comidas mais pesadas e condimentadas. De resto, um estudo divulgado há poucos dias aferiu que, no Verão, os portugueses tendem a comer menos sopa, justamente por causa do calor. A investigação, realizada pela organização internacional Growth from Knowledge, atesta que no tempo quente apenas 30 por cento dos jovens entre os 15 e os 24 anos consome sopa diariamente, sendo que no Inverno esse número duplica. Os legumes e as hortaliças também parecem seduzir mais os portugueses no Inverno (70 por cento dizem ingeri-los diariamente), com o seu consumo a cair vertiginosamente no Verão (43 por cento).

DIAS MAIS FRESCOS

ROUPA QUE PROTEGE

Naqueles dias de Verão em que só apetece deitar numa esteira à sombra e gozar a brisa do mar, a escolha do que vestimos pode funcionar como um aliado no combate ao calor, e em Portugal já está disponível roupa que protege do sol. O rótulo ultravioleta UV Standard 801 foi criado pelo Centro Tecnológico das Industrial Têxtil e do Vestuário de Portugal em 1995, e “determina o grau de protecção do artigo têxtil quando exposto à radiação, quer no estado original, quer depois de ter sido usado e lavado”. Há também o relógio-protecção, resistente à água, que indic os horários de risco para a exposição solar. Fernando Ribas dos Santos, da Associação Portuguesa de Cancro Cutâneo, explica que “a roupa tem de ser atractiva, porque não se vai dizer a uma jovem bonita e esbelta que tem de andar toda tapada”...

SOL E CALOR PODEM PROVOCAR CANCRO E "ATIRAR" DOENTES CRÓNICOS PARA SITUAÇÕES-LIMITE

“Bronzeado está fora de moda”

 

Não existe uma relação directa entre o calor e o aumento das doenças respiratórias no Verão, mas a subida das temperaturas pode aumentar a dificuldade dos doentes crónicos. O cancro cutâneo é outro dos perigos que se escondem por detrás da luz do sol...

 

CARLA TEIXEIRA

Sol e calor são sinónimos de férias, de praia e de diversão, mas são também lados diferentes de uma mesma moeda, espoletando perigos para a saúde que o cancro cutâneo está longe de esgotar. Os doentes crónicos – e de acordo com o que disse a O PRIMEIRO DE JANEIRO o pneumologista Agostinho Santos são “milhares” os portugueses que dependem de oxigénio para respirar – são vítimas fáceis do calor, uma vez que “o aumento da frequência respiratória, um mecanismo de resposta à subida das temperaturas, faz com que aqueles que normalmente já sofrem de falta de ar, sofram ainda mais, atingindo o limite que potencia a morte”. Se é certo que a transpiração se traduz numa perda de água, e que uma maior secura das mucosas facilita o surgimento de alergias respiratórias, como a asma ou a rinite, o director da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto explicou que “não há uma relação directa entre as doenças tradicionais (gripe, constipação e pneumonia) e o calor”, e que essas patologias “até são mais agravadas no Inverno”.

O que acontece, acrescentou, é que “os doentes com bronquite ligados ao oxigénio pioram muito com as temperaturas mais elevadas”, porque “desidratam com maior facilidade, e de modo inconsciente”. Segundo Agostinho Marques, “os portugueses bebem muito pouco, e se ao longo da vida os rins vão conseguindo equilibrar essa carência de água, nos idosos, que sofrem de insuficiência renal, a ingestão de mais água é fundamental”. Por isso, o médico deixou o conselho: “Devemos pegar numa garrafa de água e tê-la sempre connosco, para irmos vendo o que já bebemos. Em Portugal tem-se muito a ideia, bebendo um bocadinho, que já se bebeu o que era necessário, mas nem sempre é assim”, vincou. É nessas situações que os doentes atingem muitas vezes o seu limite, que potencia a morte.

A necessidade de estarmos conscientes dos efeitos nefastos da exposição ao sol é subscrita por Fernando Ribas dos Santos. O director do serviço de Dermatologia do Instituto Português de Oncologia do Porto e dirigente da Associação Portuguesa de Cancro Cutâneo afirmou, em declarações ao JANEIRO, que, “como acontece com o tabaco, as pessoas sabem que o sol faz mal, mas não tomam o devido cuidado”. A convicção de que “os jovens são imortais”, que diz enraizada nos adolescentes, é um dos factores predisponentes para o “alheamento irresponsável dos que pensam que o cancro só acontece aos outros. Não são os jovens de hoje. São os jovens de sempre, desde a Antiguidade”, explicou, acrescentando que “é nessa idade que os problemas começam a surgir, porque 10 ou 20 anos depois dos escaldões surgem os cancros”.

Sem consciência de que estão a hipotecar a sua saúde futura, os jovens continuam a submeter-se a longas e repetidas sessões de exposição solar – e nos solários o perigo é ainda maior, porque não ocorre o eritema que avisa que já se ultrapassou o limite de exposições –, predispondo o seu corpo ao envelhecimento precoce e às lesões irreversíveis. “É preciso reverter esses conceitos, e apostar nas campanhas de sensibilização, explicando que o bronzeado está fora de moda, e que a beleza está na protecção da pele com o seu aspecto natural, e sobretudo com saúde”.

CABE AOS TUTORES MINIMIZAR EVENTUAIS TRANSTORNOS

Animais também sofrem com o calor

 

O tempo quente não é o preferido dos nossos amigos de quatro patas. Dotados de menos glândulas sudoríparas do que os humanos, cães e gatos transpiram pouco, e dependem dos donos para enfrentar as temperaturas elevadas de forma menos penalizadora...

 

Estiraçados no chão de tijoleira ou num recanto mais sombrio do terraço. É assim que os vemos, durante o Verão, escapar-se ao calor intenso. Os animais não têm tantas glândulas sudoríparas como os seres humanos – transpiram apenas entre as almofadas das patas –, pelo que o arfar (respiração acelerada e com a língua de fora) constitui o seu principal mecanismo para evitar o sobreaquecimento. Os cães e os gatos também sofrem com o calor, mas dependem da atenção e do zelo dos donos para enfrentar com maior conforto esta época do ano. Por isso, o JANEIRO deixa algumas dicas para minimizar o seu transtorno.

A água é essencial ao bem-estar dos animais, e mesmo que tenham uma enorme taça de água, podem entorná-la e não beber. Por isso, no Verão é particularmente importante duplicar a dose. Nas viagens de automóvel convém não esquecer a água do animal, nem deixá-lo dentro da viatura durante a sua ausência. O local onde o animal repousa deve ser fresco e arejado, com sombra, e os passeios não devem ter lugar nas horas mais quentes. É natural que com o calor o seu cão coma menos, mas deve evitar esforços físicos, principalmente se começar a arfar. Muitos cães não conhecem os seus limites, e na ânsia de agradar ao dono esforçam-se demasiado. Os golpes de calor são perigosos e podem mesmo ser fatais.

C.T.

PIOLHOS E FUNGOS

"ATACAM" MAIS NO VERÃO

 

O tempo quente é mais propício ao surgimento de piolhos e infecções por fungos, e são particularmente vulneráveis pessoas com baixa imunidade, devida ao stress, a determinadas doenças, à quimioterapia ou a fármacos para diminuir a possibilidade de rejeição de órgãos transplantados. Praias e piscinas, tão frequentadas na altura de calor, são palcos de excelência para a proliferação de fungos, que provocam as aborrecidas micoses, que atacam facilmente as peles mais desprevenidas. Existem mais de 230 mil espécies de fungos, mas só uma centena provoca micoses, a que estão sujeitas praticamente todas as pessoas, já que é muito elevada a proliferação daqueles microorganismos, que se reproduzem quando estão reunidas condições ideais, de altas temperaturas e grau elevado de humidade. Porque no Verão é mais comum a transpiração e a humidade da pele, na sequência dos inúmeros banhos de mar e piscina, os fungos “atacam” mais. Ao contrário dos vírus, que sucumbem com as temperaturas altas, os fungos prosperam nesse meio. Manter a pele seca é um eficaz mecanismo de defesa, já que a sua acidez natural neutraliza os fungos, funcionando como um escudo protector.

Outro problema com tendência a agravar-se no tempo quente é o dos piolhos, que afecta sobretudo as crianças. Os piolhos são insectos parasitas, com dimensões muito reduzidas, que encontram conforto, calor e alimento junto à raiz dos cabelos, podendo propagar-se de uma cabeça para outra em poucos minutos, enquanto as crianças brincam. A Europa e os Estados Unidos são as regiões do globo em que é mais frequente o surgimento desta praga, que não deriva necessariamente de falta de higiene ou de cuidados sanitários, podendo dar-se o contágio por uma inocente partilha de pentes, escovas ou acessórios de cabelo.

C.T.

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