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REPORTAGEM PUBLICADA NO SUPLEMENTO «JUSTIÇA E CIDADANIA» DO JORNAL «O PRIMEIRO DE JANEIRO» EM ABRIL DE 2007.

ESTUDO DO OBSERVATÓRIO PERMANENTE DA JUSTIÇA PROPÕE DOIS CENÁRIOS DE MUDANÇA

Para um novo mapa judiciário

 

O novo mapa judiciário português, a entrar em vigor em 2008, deverá passar por uma reorganização assente no esquema das NUT, que põe fim às 231 comarcas e preconiza a instalação de 40 tribunais de circunscrição, propostas ao Governo em estudos da Faculdade de Engenharia Civil e do Observatório Permanente da Justiça da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra. 

 

CARLA TEIXEIRA

 

Em contagem decrescente para a entrada em vigor de um novo mapa judiciário português, agendada para Janeiro de 2008, e dando cumprimento ao disposto no programa eleitoral do Governo, que considera que “a gestão racional do sistema judicial requer o ajustamento do mapa judiciário ao movimento processual”, estão a ser analisadas no Ministério da Justiça duas propostas de revisão do esquema organizativo dos tribunais portugueses, tendo, ao mesmo tempo, sido chamadas a pronunciar-se sobre esta matéria as estruturas representativas dos agentes do sector, com vista à reunião de contributos para a melhoria do sistema. O primeiro dos documentos, apresentado à tutela em Outubro do ano passado, tem chancela do Observatório Permanente da Justiça da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra e aponta a reorganização do actual mapa (que data do século XIX) tendo por base uma divisão geográfica mais alargada, que deverá corresponder às delimitações utilizadas no modelo estatístico das Nomenclaturas de Unidades Territoriais – criadas com a adesão de Portugal à União Europeia e utilizadas para a distribuição dos fundos comunitários –, enquanto o segundo, um relatório técnico da Faculdade de Engenharia Civil da mesma academia, identifica os caminhos para concretização daquele esquema, propondo a instalação de 40 tribunais de circunscrição e o fim das actuais 231 comarcas.

O modelo preconizado não é pacífico, já que pressupõe alterações importantes à estrutura organizativa actual, que a generalidade dos agentes do sector diz estar ultrapassada, mas de forma que muitos magistrados não entendem como sendo a correcta. Segundo as duas propostas apresentadas ao Ministério da Justiça, os tribunais de circunscrição deverão substituir todos os tipos de representação da primeira instância actuais: juízos cíveis, de instrução criminal, mistos e de família e menores, e os juízes presidentes das novas unidades de gestão, com poderes e responsabilidades acrescidos, serão nomeados, por critério de mérito, pelo Conselho Superior de Magistratura, a quem reportarão as suas acções. Na síntese do primeiro estudo, a que o «Justiça e Cidadania» teve acesso, é destacado o “consenso generalizado em volta da necessidade de reorganização territorial da Justiça, orientada por razões de racionalidade do sistema e de maior qualidade da administração da Justiça”, considerando que as propostas feitas no documento concorrem para a “reafirmação e promoção do principio do acesso à Justiça e ao Direito para todos os cidadãos, o aprofundamento da qualidade do sistema, o aumento da sua eficiência, eficácia e transparência, e a modernização e o reforço da capacidade de administração e gestão do sistema judicial e dos processos”.

Os dois estudos apontam ainda para uma maior especialização dos juízes, visto que o mapa que defendem pressupõe a existência de juízos especializados com base numa diferente organização da distribuição de processos, em função do seu valor ou da moldura penal aplicável, estando igualmente prevista a extinção dos juízes de círculo. O novo mapa deverá funcionar com base na existência de cinco distritos judiciais – Norte (com 11 circunscrições), Centro (13), Lisboa (sete, inclui as regiões autónomas), Alentejo (seis) e Algarve (duas), sendo este último a criar no âmbito desta reforma –, e pressupõe a instalação de um Tribunal da Relação na cidade de Faro, opção que o juiz-desembargador da Relação de Lisboa Eurico Reis classifica como “idiota” e “uma despesa inútil”. No estudo do Observatório Permanente da Justiça justifica-se a extinção das 231 comarcas actuais com uma verdade estatística já citada pelo ministro da tutela na apresentação do estudo: em 123 das actuais comarcas (54 por cento) o volume anual de processos entrados é inferior a mil, enquanto noutras 73 (32 por cento) não atinge sequer os 500, havendo apenas 26 comarcas instaladas em Portugal a apresentar um número médio de processos entrados superior a cinco mil por ano, e 10 acima dos 10 mil processos.

 

ROGÉRIO ALVES:

"REESTRUTURAÇÃO NÃO DEVE AFECTAR CIDADÃOS"

 

Uma boa solução, que não afaste a Justiça dos cidadãos, foi o que preconizou o bastonário da Ordem dos Advogados quando instado a comentar a reformulação do mapa judicial. Rogério Alves definiu como “correcta” a extinção das comarcas, mas frisou que é essencial melhorar o acesso à Justiça. Classificando a reestruturação do mapa judiciário é “um trabalho de ourivesaria”, Rogério Alves avisou que são necessárias “boas soluções”, que não afastem os cidadãos do sistema. De acordo com o bastonário, e ao contrário do que pensa o juiz desembargador Eurico Reis (ver texto abaixo), “é indiscutível que Portugal tem, manifestamente, tribunais a mais”. O responsável frisou que “não é exigível que em cada local haja um tribunal”. Apesar de considerar que a revisão do mapa judiciário está ainda “numa fase muito precoce”, em que o projecto “é conhecido a prestações”, Rogério Alves encarou com naturalidade uma eventual contestação, mas vincou que “isso não significa que a opção do Governo seja errada”.Porém, disse que “uma coisa é concordar na generalidade, e outra é concordar na especialidade, sem conhecer todos os elementos”. Manifestando concordância com a extinção das comarcas, alertou que o “fundamental” é verificar se, dentro de cada NUT, se impõe ou não aos cidadãos sacrifícios demasiados para aceder à Justiça. A reestruturação do mapa judiciário deve, defendeu, “tentar reorganizar sem estragar ou afastar a Justiça das pessoas. Tem de tentar encontrar-se “boas soluções”, mas mantendo, tanto quanto possível, uma Justiça de proximidade.

 

PINTO MONTEIRO:

A CONTRAPROPOSTA

 

Na reacção à divulgação do estudo em que assenta o projecto de reformulação do mapa judiciário, o procurador-geral da República apresentou uma contraproposta ao Ministério da Justiça, mas não adiantou qual o seu conteúdo ou o prazo em que será expectável haver uma decisão relativa àquela matéria. Pinto Monteiro considerou ser “muito prematuro” falar de “um projecto de projecto”, como é a proposta oficial, explicando que “a Procuradoria-Geral da República apresentou uma contraproposta, como fez em relação à nova Lei de Política Criminal. “As propostas serão analisadas para se chegar a um final feliz”, disse o responsável, informando que desconhece as datas definitivas para concretização do novo mapa.

GOVERNO ABRIU DEBATE EM JUNHO DE 2006

Oito ideias para

"a reforma que faz falta"

 

Em Junho do ano passado Alberto Costa definiu-a como “a reforma que faz falta” à sociedade portuguesa. Preconizada por muitos, durante muito tempo, a revisão do mapa judiciário ganhou novo alento e está finalmente em marcha. O ministro sintetiza-a em oito pontos essenciais… 

 

CARLA TEIXEIRA

 

Após diversos anos de diagnósticos, análises, hipóteses, consensos, propostas e sugestões, que fizeram protelar o processo sem obtenção de grandes resultados, está finalmente em marcha a revisão do mapa judiciário português. Uma reforma que, segundo explicou o ministro da Justiça numa apresentação da proposta feita em Junho de 2006, deverá distinguir-se das outras tentativas falhadas de revisão, efectivando-se como “uma reforma que exista” e cumpra os “compromissos programáticos que o Governo subscreveu”, e que, segundo o titular da pasta da Justiça, deverá “desenvolver-se e aperfeiçoar-se pelo debate e aprofundamento, de modo a obter condições efectivas de enraizamento, frente a tantos e tão reconhecidos factores adversos”.

Alberto Costa resumiu em “oito ideias” uma reforma que “deve ser uma reforma a sério e não um pequeno arranjo”. Começou por sugerir “a supressão de algumas comarcas, em vez da tradicional proliferação das últimas décadas”, e frisou que “a reforma deve visar objectivos de racionalidade e de eficiência”, comprometidos nos dias de hoje, mas “fundamentalmente visar um melhor acesso à Justiça”. Na mesma sessão disse ainda ser “necessário redefinir a circunscrição territorial de referência”, preconizando uma unidade territorial “que permita ultrapassar um dos factores limitativos do sistema”: 123 das comarcas actuais (54 por cento) tem um número médio anual de entrada de processos inferior a mil, e 73 (32 por cento) não chega sequer aos 500 processos, enquanto apenas 26 das 231 comarcas têm volume médio anual superior a cinco mil processos entrados.

Constatando que o País está “retalhado por diversos mapas que se sobrepõem, com fronteiras diferentes e desencontradas para Saúde, Segurança Social, Protecção Civil, Educação ou forças de segurança”, o ministro salientou que “o novo mapa judiciário deve resistir à tentação de acrescentar um novo traçado aos que já existem”, e assumiu que esta “reinvenção do território” deverá assentar no esquema geográfico correspondente às NUT3. Num quinto ponto o responsável apontou, como efeito deste “redimensionamento”, a atribuição de novos poderes e novas responsabilidades aos juízes presidentes, dotando-os de um novo estatuto. Porque o redimensionamento da unidade de referência constitui “uma oportunidade excepcional para a diferenciação de respostas e a especialização”, disse que o mapa deve “distinguir, em termos de exigências de proximidade territorial, o que não deve ser tratado como igual”.

Alberto Costa concluiu dizendo que os tribunais deverão ser libertados de “tudo o que não precisa de passar por eles”, o que impõe “articulação territorial no âmbito da unidade de referência apropriada entre soluções judiciárias e extrajudiciais”. Num oitavo ponto, o ministro da Justiça frisou que a revisão “supõe uma genuína intenção reformista”, mas avisou que “o que nasce com a rigidez não deve deixar-se capturar pela rigidez, admitindo que, “articulada uma solução, ela possa ser implementada gradualmente, com avaliação da experiência”.

CONTENÇÃO DE DESPESAS NOS ÚLTIMOS DOIS ANOS LIBERTOU VERBAS PARA NOVOS PROJECTOS

Governo investe na renovação do parque judicial

 

Os “bons resultados” do esforço de contenção da despesa preconizado pela tutela nos dois últimos anos permitiram angariar verbas suficientes para alavancar obras de renovação, construção e melhoria das instalações em diversos equipamentos do parque judicial nacional.

 

O Ministério da Justiça anunciou no passado dia 30 que investiu 7.115.820 euros na remodelação de edifícios e na construção de novas instalações para tribunais no ano transacto, adiantando que no Tribunal da Boa Hora, no Tribunal de Execução de Penas (Monsanto), no Tribunal do Trabalho da Maia, no Tribunal Judicial da Marinha Grande, no Tribunal Central Administrativo do Norte, nos Juízos Criminais do Porto, no Tribunal do Trabalho de Viana do Castelo e no edifício da Procuradoria-Geral da República (Lisboa) foram realizados melhoramentos, tendo ainda sido inaugurados os Palácios da Justiça de Sintra, Ribeira Grande (2005) e Silves (2006), e ampliado o de Oeiras. Em 2005 abriu também portas o Tribunal de Família e Menores de Vila Franca de Xira.

No ano em curso foi já inaugurado o Tribunal do Trabalho de Lisboa, prevendo-se a remodelação das instalações do Departamento de Investigação e Acção Penal de Évora, dos Tribunais do Trabalho de Penafiel e Oliveira de Azeméis, a conclusão do Palácio de Justiça de Famalicão (8.950.000 euros) e o arranque das empreitadas em Felgueiras (tribunal, julgados de paz e conservatórias civis e prediais, no valor de três milhões de euros), e Oliveira do Bairro (2,5 milhões). O Ministério da Justiça lançou ainda um projecto de obras com vista à ampliação do número de salas de audiência nos tribunais cujos edifícios, construídos nas décadas de 1960, 70 e 80, foram concebidos para um número de juízos inferior ao actual. “Neste projecto estão incluídas 50 novas salas de audiência, que representam um investimento global de 3,5 milhões de euros até 2008.

Em paralelo a tutela lançou os Campus de Justiça, a concretizar nos próximos anos nas cidades de Lisboa, Porto, Coimbra, Faro e Leiria, e que pretendem instituir-se como “uma solução para as necessidades de instalações” em algumas das maiores comarcas do País. A criação dos Campus de Justiça permitirá concentrar todos os tribunais e outras entidades no mesmo local, garantindo a disponibilidade e o acesso facilitado dos cidadãos a todo o tipo de serviços relacionados (judiciais, registos, notariado, Medicina Legal e Polícia Judiciária). Aos magistrados e funcionários as novas estruturas disponibilizarão áreas de trabalho adequadas, beneficiando ainda os operadores judiciais e o público. A tutela congratulou-se pelos “bons resultados” das medidas de contenção da despesa implementadas nos dois últimos anos, que permitiram libertar importantes verbas, que agora poderá investir na renovação do parque judicial.

 

EURICO REIS MUITO CRÍTICO DE "UMA SOLUÇÃO BUROCRÁTICA E APARENTEMENTE MAIS FÁCIL"

"Um estudo para deitar ao lixo"

 

O estudo que serve de base ao projecto de reforma do mapa judiciário é, segundo Eurico Reis, “para ir para o lixo”. O desembargador considera que ele atenta contra o programa e as intenções do Governo e “é um remendozinho no curtíssimo prazo, com consequências desastrosas”. 

 

CARLA TEIXEIRA

 

O juiz desembargador do Tribunal da Relação de Lisboa Eurico Reis considera que “não está em causa a necessidade de alterar o actual mapa judiciário”, que data do século XIX e está “obviamente muito desactualizado”, mas afirma que o estudo que sustenta o projecto de reforma do Ministério da Justiça não cumpre os objectivos e, no limite, agravará os problemas de acessibilidade e eficiência do sistema, que são já muito gravosos. Eurico Reis explica que a ideia preconizada corresponde a “uma solução burocrática e aparentemente mais fácil, que é a onda de fechar coisas”, e vai mesmo ao ponto de considerar que “o estudo foi encomendado a pessoas que não percebem nada do sistema” e é “para ir para o lixo”.Garantindo que “é possível reformular o mapa judiciário em vigor sem fechar um só tribunal”, o magistrado diz “não ter adjectivos para classificar as propostas”, e refere mesmo que “o estudo atenta directamente contra o programa e contra as intenções do Governo expressas pelo ministro da Justiça no arranque da legislatura”.

Sobre o encerramento de alguns tribunais e a substituição das comarcas por cinco distritos judiciais decalcados sobre o esquema geográfico das Nomenclaturas de Unidades Territoriais, Eurico Reis reserva uma posição crítica, considerando preferível optar pela extinção das comarcas e pela constituição de unidades territoriais que tenham em conta a história da Justiça e não as NUT, representadas preferencialmente por um presidente eleito e em que os juízes concorressem para uma unidade e não para um tribunal específico. O juiz desembargador aponta como critério essencial à definição de um novo mapa judiciário a questão da especialização das competências, frisando que “a existência de tribunais de competências mistas é ineficaz e causa grandes atrasos”, já que, na convivência das instâncias cível e criminal, as matérias de competência cível “ficam obviamente para trás, à excepção dos processos relacionados com menores”, pelo que “não há uma optimização do funcionamento dos tribunais”. Eurico Reis defende claramente a aposta na “especialização dos tribunais de primeira instância” e atesta que, através da criação de estruturas com juízos especializados, que devem estar presentes em todas as unidades geográficas que venham a ser implementadas, os processos passarão a ter um tratamento mais célere.

 

INTERIOR HOSTILIZADO

 

A favor da “optimização da utilização dos recursos humanos em todas as unidades geográficas”, do não encerramento de quaisquer tribunais e da submissão de todos eles, incluindo os administrativos e fiscais, a “um único Supremo”, Eurico Reis frisa que é necessário estudar alternativas, porque a reforma defendida no estudo feito pelo Observatório “só agrava os problemas que existem”, sendo mesmo “irracional em muitos aspectos”. Como exemplo o magistrado cita a intenção “absolutamente idiota” da criação de um Tribunal de Relação em Faro, explicando que “a criação de uma estrutura para 16 magistrados no Algarve teria os mesmos custos, de tempo e dinheiro, que a Relação de Lisboa, onde trabalham cerca de 100”. Numa altura em que o País atravessa um momento de “racionalização dos gastos”, o juiz considera que a Relação de Faro será “uma despesa absolutamente inútil”.

Sugerindo que “há algumas medidas que soam a compensações políticas”, Eurico Reis admite que a tutela queira dotar o Algarve, “porque é o Algarve”, daquele tipo de estrutura, da mesma forma que “Guimarães ganhou um tribunal de Relação sem justificação”, em jeito de prémio de consolação “por ter perdido Vizela”, que ganhou autonomia como concelho. Por outro lado, o desembargador considera que, à luz do estudo recentemente divulgado, continuará a haver uma “hostilização do Interior e das suas populações”, avisando que “o Ministério fia-se muito nos computadores e na chamada desmaterialização dos processos, mas o nosso sistema informático falha muito e muitas vezes”, e deslocalizar determinados serviços para diferentes locais vai mexer com a vida dos funcionários e dos cidadãos.

Por tudo isto Eurico Reis considera que o estudo encomendado pelo Observatório Permanente da Justiça enferma de grandes incongruências, podendo constituir, “no curtíssimo prazo um remendozinho”, mas traduzindo-se numa medida que, “a curto prazo já começará a dar problemas, e a médio e longo prazo será desastrosa”. Na opinião do magistrado “ainda é possível” inflectir o rumo: “Talvez não seja possível ter o novo mapa judiciário pronto em Janeiro de 2008, mas poderá ser em Janeiro de 2009, assim haja vontade política”, disse. Para Eurico Reis “também seria bom haver uma atenção especial dos autarcas e dos cidadãos para esta matéria”, uma vez que, sublinhou, “a Justiça é hoje um pilar fundamental do sistema político e do próprio sistema económico”, tendo a sua desactualização “efeitos terríveis”…

 

"TASCAS DE JUSTIÇA" ANGUSTIAM AUTARCAS

 

A proposta de revisão do mapa judiciário prevê a reconversão de 28 tribunais de comarca em casas da Justiça, ideia que não colheu agrado na generalidade das autarquias afectadas pela medida. As localidades de Vouzela e Tabuaço (Viseu), Cerveira (Viana do Castelo), Penela e Pampilhosa da Serra (Coimbra), Mértola, Portel, Arraiolos, Avis e Fronteira (Alentejo) contestaram de imediato a proposta, por temerem que a criação do que definiram como meras “tascas de Justiça”, que de acordo com os dirigentes políticos locais apenas terão funções muito restritas e inúteis, contribua para aumentar o nível de desertificação nos seus concelhos. “Não será mais do que um balcão para entregar e receber papelada”, considerou José Pinto dos Santos, autarca de Tabuaço, lamentando que um edifício com 15 anos possa vir a ter tão redutoras funções. O presidente da Câmara de Vouzela, Telmo Antunes, disse que reconverter os tribunais de comarca em casas da Justiça “é uma questão meramente estética, porque não funcionará lá nada” a que não se possa aceder através da internet, por exemplo. “Será apenas uma loja, mas para tapar os olhos o Governo gosta de dar nomes pomposos às coisas”, concluiu, numa posição assumida também pelo presidente da Câmara de Vila Nova de Cerveira, José Manuel Carpinteira, que classificou a medida como “absurda” e garantiu “uma posição firme” contra a sua implementação. Também o autarca da Pampilhosa da Serra se insurgiu contra o eventual encerramento da comarca local, considerando que acentua “a desertificação e o despovoamento progressivo do Interior”. O vice-presidente da Câmara de Penela, José Reis, informou o município não comenta a extinção do tribunal por “oficialmente, não ter conhecimento de nada”. No Alentejo as críticas partiram dos autarcas e do Sindicato dos Funcionários Judiciais: “É uma tentativa do Governo de, através de medidas economicistas, travar o acesso dos cidadãos à Justiça”, disse o sindicalista António Castor.

JUÍZES EXIGEM MELHORES CONDIÇÕES DE TRABALHO

 

Um estudo da Associação Sindical dos Juízes Portugueses divulgado no fim do mês de Março veio sugerir a calendarização, pelo Governo, da construção, ampliação e reabilitação dos edifícios judiciais em coordenação com o novo modelo de orgânica judiciária, previsto para 2008. Num relatório sobre organização, funcionalidade e segurança nos tribunais judiciais de primeira instância, a ASJP diz que, “para as situações de maior carência devem ser encontradas soluções no imediato, identificando os tribunais que não reúnem as condições mínimas de dignidade e funcionalidade para acolher serviços, e os locais onde é prioritária a instalação de novos tribunais ou a ampliação dos existentes”.

O estudo refere que Governo, Conselho Superior de Magistratura e representantes dos juízes e de outros profissionais de Justiça devem, em conjunto, repensar o modelo adequado de tribunal, “de modo a que os edifícios e equipamentos incorporem as novas exigências tecnológicas e de gestão, racionalizando de forma mais eficiente a afectação dos espaços aos serviços”.O documento defende ainda a necessidade de “um esforço de aquisição de edifícios que arrendados a entidades particulares e que se considere serem adequados para a instalação definitiva de tribunais”, e refere que a escolha da instalação dos novos edifícios deve ter em conta a fácil acessibilidade e proximidade dos centros urbanos e de serviços. Relativamente aos tribunais que não cumprem as regras de higiene, saúde, segurança e acessibilidade de deficientes, “deve procurar-se, no curto prazo, dotá-los das condições legalmente prescritas como obrigatórias”, enquanto também “os tribunais de menores devem ser adaptados à sua especificidade, criando-se, ao menos nos maiores, zonas de espera, com higiene e alimentação, adequadas às muitas crianças que diariamente se dirigem a esses serviços”.

Em relação às novas tecnologias ao serviço da Justiça, preconiza-se o estudo das hipóteses de substituição gradual dos equipamentos de secretária por equipamentos portáteis, com acesso móvel à internet. “Cada juiz tem de dispor de um computador que lhe permita a audição de CDs, para controlo das escutas e das gravações da prova das audiências”, refere o documento. Os juízes presidentes devem assumir uma cultura de auto-responsabilização de gestão administrativa do seu tribunal, com uma intervenção efectiva em todas as matérias que tenham a ver com a organização de recursos, equipamentos e espaços, reportando as dificuldades ao CSM. Instado a comentar o estudo, o secretário de Estado adjunto e da Justiça disse que “a maioria dos tribunais tem boas condições, mas há falhas, e estamos no terreno a melhorar a gravação das audiências e o sistema de segurança”.

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