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REPORTAGEM PUBLICADA EM EXCLUSIVO NO JORNAL «O PRIMEIRO DE JANEIRO» A 31 DE JANEIRO DE 2007

CONSULADO ATENTO

 

A polémica reforma da rede consular portuguesa recentemente aprovada pela tutela ditou o encerramento do Consulado de Roterdão, mas nas últimas semanas aquela instância tem demonstrado maior sensibilidade para o problema dos portugueses na Holanda.

Depois da exoneração do cônsul Óscar Ribeiro Filipe, e da nomeação, em sua substituição, de Vítor Sereno, que estava à frente do Consulado de Estugarda, na Alemanha, António Braga, secretário de Estado das Comunidades, garantiu que o consulado está a acompanhar a situação dos cidadãos portugueses que se queixam de exploração e de trabalhar sem receber salários.

Respondendo ao repto lançado por José Xavier, presidente do Conselho Regional das Comunidades na Europa, foi anunciada pela tutela a decisão de providenciar assistência social e jurídica àqueles cidadãos junto do tribunal de trabalho holandês.

 

Entendimento…

O novo cônsul, que assumiu funções, com carácter temporário, a 16 de Novembro do ano passado, já se avistou com os trabalhadores queixosos das condições de laboração naquele país, e encontra junto da comunidade portuguesa esperança num melhor desempenho do que aquele que teve o seu antecessor.

Ontem mesmo, Vítor Sereno reuniu-se com um grupo de seis portugueses que, no final da passada semana, se queixou de idêntico problema em Alkmaar, promovendo a dinamização de uma plataforma de entendimento que culminou na resolução do diferendo entre os portugueses e a empresa de trabalho temporário que os tinha contratado do lado de cá da fronteira.

Instado a tecer um comentário sobre o caso, o cônsul português em Roterdão remeteu a prestação de declarações para o gabinete do secretário de Estado das Comunidades, que até ao fecho desta edição não foi possível.

 

C.T.

 

TRABALHADORES PORTUGUESES NÃO RECEBEM HÁ SEMANAS

Explorados na Holanda

 

Foram recrutados no Porto, com promessas de bons salários na Holanda. Num mês fizeram menos horas do que as prometidas por semana, e do salário viram os zeros que sobraram do pagamento da casa, do seguro e do transporte. São portugueses tomados pelo desespero…

 

CARLA TEIXEIRA

 

A história é comum e recorrente: respondem a um anúncio de jornal, são chamados para uma entrevista num hotel do Porto, e dias depois deixam o seu país em busca de melhores condições de vida na Holanda. Levam na mala a coragem de começar tudo de novo, longe da família, e a esperança nos “salários de 1500 euros” que lhes prometem antes da partida, conseguidos à custa de 37 horas de trabalho semanais, que só em casos raros conseguem cumprir. É que, de acordo com o testemunho de alguns portugueses ouvidos por O PRIMEIRO DE JANEIRO e secundados por José Xavier, presidente do secretariado do Conselho Regional das Comunidades Portuguesas na Europa, “trabalha-se umas semanas. Depois, de repente, o trabalho escasseia, e o salário, fruto do esforço dessas horas, nunca mais vem”. Passam-se as semanas, e nas contas destes homens já vão três sem receber nada.

Alojados num “parque de campismo”, garantem que são mais os dias em que ficam em casa do que aqueles em que trabalham, havendo um homem que, tendo sido recrutado há um mês, ainda não cumpriu as horas estipuladas para uma semana, que lhe garantiriam o “salário elevado” que lhe foi prometido em Portugal, enquanto outro trabalhador assegura que, no mesmo intervalo de tempo, só auferiu 31 euros, depois de descontados o pagamento da casa, do seguro e do transporte. “Isto não é uma agência de emprego, é uma agência imobiliária. Trabalhamos o que é suficiente e necessário para pagar essas despesas, e depois recebemos recibos a zero”, denunciou um dos portugueses.

A pauta de «dispensados» relativa ao dia de ontem, a que o JANEIRO teve acesso, mostrava que 58 pessoas (46 portugueses e 12 polacos) estavam de folga, mas dois trabalhadores garantiram que “há dias em que são 80”, e que “são sempre mais portugueses, porque os polacos trabalham a preços mais baixos”. A revolta já tomou conta de alguns daqueles homens, que em episódios diferentes incendiaram três casas e um automóvel. Não obstante, estranham que aqueles delitos, que “na Holanda são considerados crimes graves”, tenham sido “abafados” pela Hands to Work, empresa de trabalho temporário angariadora de recursos humanos. Ao JANEIRO as mesmas fontes revelaram que ontem de manhã teria saído da cidade do Porto um autocarro fretado para levar um novo carregamento de trabalhadores para a região.

Uma informação peremptoriamente desmentida por Marta Correia, responsável de recrutamento e selecção de trabalhadores para a Hands to Work em Portugal. De acordo com aquela funcionária, que sublinhou fazer apenas “divulgação das ofertas de emprego”, apenas quatro mulheres terão seguido ontem para a Holanda naquele autocarro, e não “um carregamento de pessoas para substituir os que estão lá sem fazer nada”. Disse ainda que “há quem esteja em casa porque recusou trabalhos ou porque faltou ou chegou tarde demasiadas vezes, ou até porque foi apanhado com álcool no sangue meia hora antes de ir para o trabalho, o que em termos de higiene e segurança é impensável”.

Marta Correia assegura que “é mentira” que haja portugueses explorados na Holanda, e não acredita que haja má-fé da empresa contratante. “Há pessoas que estão com pouco trabalho, mas têm acesso a dinheiro quando têm dificuldades e apoio se quiserem voltar a Portugal. Não tendo obrigação, “por uma questão humanitária” contacta com a empresa se há queixas. Diz que “os polacos têm mais problemas do que os portugueses” (são mais faltosos), mas os lusitanos “dizem muita coisa que não é verdade”. Ainda assim, “em momento algum ficam desprovidos de ajuda. Os problemas resolvem-se pelo diálogo”, vinca.

 

EXPORTAR DESEMPREGO

 

O presidente do secretariado do Conselho Regional das Comunidades na Europa é peremptório na análise da situação dos portugueses que se queixam de exploração laboral na Holanda, que tem sido recorrente e sistemática ao longo dos últimos três ou quatro anos.

Segundo José Xavier, Portugal está a “exportar desemprego e problemas sociais”, porque é na falta de condições que encontra no seu país que a maioria dos portugueses que emigra decide fazê-lo, deixando tudo para trás para começar de novo.

No entanto, como disseram outras fontes ouvidas pelo JANEIRO, “os angariadores dessa mão-de-obra não fazem bem as coisas”, porque não são claros relativamente às reais condições de trabalho e “iludem os candidatos com promessas de salários muito elevados, sem mostrarem como se passam as coisas de facto”.

 

“Defraudados”

A falta de informação é, segundo José Xavier, o grande problema das pessoas que, já desesperadas pelas dificuldades que experimentam em Portugal, decidem rumar ao estrangeiro perseguindo um sonho. “É criada uma grande ilusão, nomeadamente junto dos jovens, que deixam tudo para vir para a Holanda, mas depois se vêem defraudados”. 

Mesmo diante da mediatização de casos problemáticos “é incrível” o número de pessoas dispostas a emigrar, quase sempre sem saber as implicações dessa decisão, atesta o conselheiro. Dando ao actual cônsul o benefício da dúvida, José Xavier recorda que “o anterior nada fez”, e vai mesmo ao ponto de dizer que, como ele, “também o embaixador devia ter sido exonerado”.

Ao Governo pede “que faça o que prometeu: mudar a lei e atacar os angariadores fraudulentos”, mostrando esperança por “os deputados no Parlamento estarem agora a pegar no assunto”.

 

C.T.

 

REPORTAGEM PUBLICADA EM EXCLUSIVO NO JORNAL «O PRIMEIRO DE JANEIRO» A 1 DE FEVEREIRO DE 2007

DENÚNCIA FEITA AO JANEIRO ESPOLETOU MOVIMENTAÇÕES NO NORTE DA HOLANDA

Portugueses explorados perto da solução do problema

 

A reportagem sobre portugueses explorados na Holanda publicada ontem pelo JANEIRO abriu caminho à resolução do problema ainda antes de o jornal chegar às bancas. Consulado, empresa e trabalhadores já esboçaram um acordo, e Ilda Figueiredo também tomou medidas. 

 

CARLA TEIXEIRA

 

O caso dos trabalhadores portugueses recrutados há cerca de um mês no Porto para trabalhar no Norte da Holanda, onde estarão a ser explorados, segundo uma denúncia feita a O PRIMEIRO DE JANEIRO e de que o nosso jornal deu conta na sua edição de ontem, teve novos desenvolvimentos ainda antes da publicação da reportagem. O grupo de portugueses estava a passar por grandes dificuldades na sequência de, nas últimas semanas, não ter tido um volume de trabalho suficiente para assegurar o alto ordenado prometido. Além de o trabalho ter escasseado, os descontos absorveram tudo o que teriam recebido como contrapartida do esforço (para assegurar o pagamento de alojamento, seguro e transportes), e alguns dos homens ainda não tinham o valor correspondente às horas cumpridas.

Alertado para a situação, e posto em contacto com os queixosos pelo JANEIRO, o cônsul de Portugal em Roterdão foi ao encontro dos portugueses, com quem se reuniu até à meia-noite de anteontem, avistando-se também com a direcção da empresa Hands to Work, angariadora de mão-de-obra temporária, apelando a um entendimento entre as partes. De acordo com Fernando Barbosa, um dos autores da denúncia, o entendimento terá começado a esboçar-se ontem, após a visita do cônsul, que abriu caminho a uma série de contactos e reuniões. Ilda Figueiredo, eurodeputada portuguesa, também contactou os portugueses para se inteirar da situação, mas a pedido do Consulado de Portugal em Roterdão decidiu não os visitar, evitando a exagerada mediatização do caso.

Segundo Fernando Barbosa, o ambiente nas instalações onde estão alojados os queixosos “melhorou logo”, na sequência da visita do cônsul e do contacto da eurodeputada, tendo um dos delatores dito ao JANEIRO que ontem os homens estavam já “muito mais animados”. A propósito deste e de outros casos que têm vindo a público na Holanda, relativos a portugueses explorados e com problemas de discriminação, Ilda Figueiredo interpelou a Comissão Europeia, abordando os problemas de identificação dos portugueses residentes naquele país-membro. O Bilhete de Identidade luso é suficiente para viver e trabalhar na Holanda, mas não para identificar o portador em bancos ou estações de correios.

A Comissão explicou que “qualquer cidadão da UE goza do direito de circular e permanecer livremente” nos vários países-membros, salvo em algumas situações limitativas legalmente previstas, e previu que, no futuro, seja “possível intervir em caso de comportamentos discriminatórios que tenham por base a nacionalidade ou residência dos destinatários dos serviços”. Ao fim da tarde de ontem Fernando Barbosa fez ao JANEIRO um resumo da reunião de várias horas com a direcção da Hands to Work, congratulando-se com o resultado da negociação. Na reunião a empresa garantiu precisar dos trabalhadores, alegando que a época é má, mas vai melhorar. A carga com o alojamento baixou, sendo agora dependente do volume de trabalho: gratuito para quem fizer menos de 10 horas semanais e gradual a partir daí. Os salários em atraso serão de imediato processados.

 

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