Ser feliz a trabalhar: é possível?
- Carla Teixeira
- 12 de mar. de 2022
- 4 min de leitura

Se entrássemos numa sala com 100 pessoas e lhes perguntássemos, em voz alta, de que precisariam para poderem dizer que estavam felizes, ou pelo menos satisfeitas, com o seu trabalho, arrisco a dizer que a esmagadora maioria diria um salário mais generoso. Não vou desvalorizar a resposta, que tem obviamente uma enorme relevância (se trabalhar fosse assim tão satisfatório só por si ninguém precisaria de ser pago para trabalhar, não é?).
Ouvimos amiúde que trabalhadores mais felizes são trabalhadores mais produtivos. Tendo a concordar com essa ideia. No entanto, se falarmos do que faz com que sejam mais felizes, dos aspectos que positivamente contribuem para esse objectivo, já não estou tão certa de que seja simples ou sequer linear defini-los.
Dinheiro é bom, mas não é tudo. Há muito, muito mais aspectos que contribuem para elevar, ou aniquilar, de forma decisiva o índice de satisfação laboral do que apenas o salário. Desde logo as condições físicas e de conforto em que exercemos a nossa actividade: se temos a logística ideal e necessária (se nos sentamos em cadeiras confortáveis, se a luz ou a temperatura da sala em que trabalhamos é adequada, se não chove lá dentro, se conseguimos evitar o conflito permanente com o colega que gosta de ter sempre a porta aberta porque é contra o ar condicionado, se está assegurado o ambiente tranquilo e de serenidade que contribui para um melhor desempenho ou se temos elementos perturbadores como ruído ou, pior, as mais do que comuns intrigas entre funcionários que focam mais as suas atenções em competir com os outros do que em investir na sua própria evolução).
Não há uma receita universal para a satisfação no trabalho. Como diz o ditado, cada homem tem os seus pés e os seus próprios sapatos. "O homem é o homem e a sua circunstância", como tão bem resumiu Ortega y Gasset. O clima organizacional é fundamental para aumentar este índice: se sentimos que somos apreciados, reconhecidos, valorizados. Não terão os nossos superiores de estar sempre a elogiar-nos, mas uma palavra de reconhecimento de vez em quando cai bem! Sobretudo se sentimos que carregamos às costas uma equipa e no fim todos são compensados da mesma forma: com um salário igual e muito silêncio.
Se formos permanentemente atropelados com mais e mais tarefas, sem que tenhamos tempo ou condições de cumprir cada uma delas com a qualidade desejada, isso também vai aumentar o nosso desconforto e, por essa via, a nossa insatisfação. Se quando saímos do emprego a cabeça continua a fervilhar com o que ficou por fazer, ou com o que poderíamos ter feito melhor se pelo menos tivéssemos tido mais uns minutos, então não estamos a deixar entrar em nós a sensação de satisfação, realização e felicidade. Se quando entramos ao serviço temos já no pensamento o temor de que o dia corra mal, porque há tanto para fazer e tão pouco tempo para executar com mérito e qualidade essas tarefas, então estamos a "stressar" e a sofrer, e esse não é o caminho para a satisfação laboral ou sequer para a nossa realização enquanto trabalhadores e enquanto indivíduos até.
Competitividade exacerbada, assédio moral ou sexual, preconceito, racismo, rebaixismo... Tudo isso nos afecta, tudo isso nos corrói, tudo isso nos impede de sermos saudáveis e felizes, quer do ponto de vista laboral quer no que concerne o plano pessoal. Uma empresa que pretenda fazer a diferença e garantir a satisfação dos seus funcionários no trabalho terá forçosamente de entender as dores, as necessidades e as limitações de cada um deles. Terá de saber jogar com essas circunstâncias, minimizando aspectos negativos e lançando cordas que permitam elevar os mais positivos. Porque um colaborador motivado, que se sente capaz, que se sente apreciado, é um colaborador mais activo, mais engajado, mais produtivo e mais feliz. No trabalho e na vida.
Numa era em que a psicoterapia e o mindfulness vão ganhando mais e mais adeptos, também no plano laboral se tem intensificado a atenção dada à dimensão psicológica do ser humano. E se o objectivo nas empresas é exponenciar a produtividade e melhorar o desempenho dos seus quadros, a aposta na satisfação e no entrosamento entre todas as componentes deverá ser um dos caminhos a seguir. É crucial que as empresas aprendam a evitar e saibam também lidar com distúrbios emocionais como a ansiedade, a depressão ou o burnout, que podem ter origem em problemas do foro pessoal, mas podem também derivar da pressão profissional ou serem acicatados por ela.
Ter um plano de carreira, com perspectivas de evolução no seio da empresa, pode contribuir para uma maior felicidade no trabalho, do mesmo modo que certamente contribui para isso que o trabalhador saiba que é ouvido e o seu contributo valorizado como peça fundamental do xadrez laboral. A abertura ao diálogo no seio da estrutura empresarial, aproximando todos os colaboradores e estes da Administração e da equipa responsável pelos Recursos Humanos, são estradas que também nos levam ao plano desejável da harmonia e da felicidade laboral.
Aprender a escutar toda a equipa, os seus anseios e as suas dificuldades, procurar respostas, apostar no treino e na formação constantes, maximizando competências e apostando sempre na qualidade do serviço prestado, preparar as lideranças, nunca abrir mão da exigência tendo sempre na mira a excelência são, na minha opinião, caminhos de sinal obrigatório. A prática de horários flexíveis mas bem escalonados, que não promovam desnecessariamente as horas extraordinárias, que dêem tempo ao trabalhador para ter uma vida pessoal e social saudável, que incentive a prática de exercício físico, uma alimentação saudável (sem a correria habitual de quem se vê forçado a "encaixar" o almoço entre compromissos profissionais cujos timings não controla), são aspectos cruciais nesta busca de maior satisfação e equilíbrio profissional e pessoal.
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